E como está, afinal, o mar de Magalhães 500 anos depois?

Estrutura de Missão Sep 24 2022

A Madeira foi palco, no passado dia 23 de setembro, da conferência “O Mar de Magalhães, …

A Madeira foi palco, no passado dia 23 de setembro, da conferência “O Mar de Magalhães, 500 anos depois”, promovida pela Estrutura de Missão do V Centenário da Primeira Viagem de Circum-navegação de Fernão de Magalhães e pela Assembleia Legislativa da Madeira.

Ao longo de todo o dia, investigadores nacionais e internacionais reforçaram o papel importante que o mar pode ter enquanto fonte de conhecimento e de desenvolvimento económico para o país e para o mundo.

Imagem cedida pela ALRAM

Na parte da manhã, o Presidente da Estrutura de Missão, José Marques, começou por reforçar a natureza reflexiva da conferência e a forma como é um contributo sobre “o mundo que herdámos e o mundo que pretendemos construir”. Defendeu ainda que “o mar deverá ser um desígnio prioritário para Portugal e o mundo”, uma vez que considera a “economia do mar um aspeto central” para a “promoção de melhores condições de vida e a construção de um mundo melhor”.

Víctor Freitas, Vice-Presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, após fazer a abertura da jornada de trabalhos, apontou como potencialidades da região da Madeira o crescente número de navios registados na mesma, a importância das atividades marítimo-turísticas, o desenvolvimento da piscicultura (desde que compatibilizado com outras atividades, como o turismo) a investigação científica e ainda o alargamento da plataforma marítima.

O tema “o Legado Científico e cultural da Primeira Viagem de Circum-navegação” foi abordado por Thomas Dellinger, biólogo, investigador e professor da Universidade da Madeira. De acordo com o mesmo, “Magalhães está na base de uma sucessão de navegadores que nos permitiram conhecer a terra e o mar, tal como o conhecemos hoje”, logo, a celebração da sua circum-navegação é também o reconhecimento e a valorização da ciência, da curiosidade científica e do conhecimento.

José Manuel Nuñez de la Fuente, Antropólogo e Historiador de Sevilha, reforçou o ponto de vista de que “a viagem de Magalhães não só deu origem à primeira circum-navegação do planeta, como também representa um extraordinário legado patrimonial que simboliza as demais viagens de exploração que ampliaram a visão do mundo que habitamos”.

Rui Caldeira, investigador principal da ARDITI (Agência Regional para o Desenvolvimento da investigação, Tecnologia e Inovação) entende que as ilhas têm muito para dar à economia, à ciência e à sociedade, pelo que realçou a forma como a Madeira tem estado a trabalhar para contribuir para um crescimento informado da economia do mar. Considera ainda que os oceanos são críticos para a sobrevivência e o bem-estar da Humanidade e que, como tal, é necessário conhecer e entender a influência do mesmo e a nossa influência no mesmo.

Francisco Andrade, investigador e professor da Universidade de Lisboa, afirma que o planeta enfrenta um novo desafio: entender o Antropoceno (termo utilizado por alguns cientistas para descrever o período mais recente na história do Planeta Terra) e lidar com o mesmo. Acredita que “há 500 anos, a viagem de Magalhães veio demonstrar a continuidade dos mares de um planeta finito” e que atualmente “precisamos de (re)tomar uma consciência renovada dessa finitude e continuidade” e construir “o cenário onde queremos vir a estar no futuro”, com vista a um desenvolvimento sustentável.

Imagem cedida pela ALRAM

Já na segunda parte da conferência, os investigadores e decisores foram unânimes em afirmar que as medidas adotadas na Região Autónoma da Madeira são pioneiras e garantem a sustentabilidade dos recursos naturais marinhos. Ainda assim, consideram que proteger as espécies e os ecossistemas e aproveitar o potencial da economia do mar e da economia azul em prol do bem-comum é um trabalho contínuo.

Mafalda Freitas, Diretora Regional do Mar, começou por referir que a investigação científica, a literacia do Oceano e a economia azul circular são vitais na estratégia da Região para o Mar. Destacou o Plano de Situação do Ordenamento do Espaço Marítimo (PSOEM), um instrumento que constitui uma ferramenta essencial para a política do mar e assegura o desenvolvimento da economia azul e a sustentabilidade do meio marinho, tal como está definido pela Diretiva-Quadro Estratégia-Marinha e pela Estratégia Nacional para o Mar. Deu ainda enfâse aos TUPEM (Títulos de utilização privativa do espaço marítimo), emitidos para a instalação de cabos submarinos que visam dotar a RAM de um sistema de cabos de elevada capacidade e fiabilidade.

Manuel Biscoito, biólogo especialista em ambiente e investigador da fauna marinha, em particular peixes de águas profundas, afirmou que as Áreas Marinhas Protegidas (AMP) são espaços integralmente delimitados em águas marinhas, dotados de legislação específica, com o propósito de reforçar a conservação da natureza e biodiversidade marinha e contribuir para uma utilização sustentável dos recursos naturais marinhos. Este ponto de vista foi reforçado por Manuel Filipe, Presidente do Conselho Diretivo do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza da Madeira, que destacou que a Região Autónoma da Madeira tem uma larga tradição de implementação de áreas marinhas protegidas, estando cerca de 89% do seu mar territorial atualmente protegido. Manuel Filipe defendeu ainda que “as recentes áreas protegidas criadas pelo Governo Regional da Madeira tiveram por base um novo conceito: Mar e Terra” e afirmou que se têm aumentado as zonas protegidas para que possam ser visitadas de forma mais sustentável, promovendo um “Turismo Científico”.

Na sessão de encerramento, o Secretário Regional de Mar e Pescas, Teófilo Cunha, afirmou que “o país caminha na direção certa” e que “o mar é um pilar fundamental da sustentabilidade do planeta e, por isso mesmo, sem um mar devidamente são, teremos muitos problemas no planeta em que todos habitamos”. Desmistificou ainda o estigma de que as reservas e a proteção não são compatíveis com a economia, ao afirmar que é possível haver uma articulação bem elaborada e reforçou que economia do Mar na Região Autónoma da Madeira representa 5% do PIB regional e cerca de 10% do emprego. Encerrou a conferência deixando uma mensagem de apelo: “O uso do Mar tem de ser feito de forma sustentável e consciente”.